Total de visualizações de página

‘O futebol do Rio de Janeiro está morto’, diz Paulo César Caju, ídolo de Flu e Botafogo

Guto Seabra

Tal como a fruta que carrega como sobrenome, Caju solta uma cica para falar do futebol brasileiro, mas traz na essência da crítica a vitamina para recuperar o prestígio perdido. Sem meias palavras, Paulo César Lima, o Caju, que está na história de Botafogo (bicampeão 1967/68) e Fluminense (Máquina Tricolor), levanta a voz contra a mesmice, a queda da seleção brasileira, fala em preconceito no Brasil contra os negros no futebol... Com vocês, Caju.

EXTRA: Vem aí a final entre Botafogo e Fluminense...

Hoje, os dois times não são nem caricatura do Botafogo, bicampeão de 68, e a Máquina Tricolor. O Botafogo de 68 foi a base da seleção brasileira na fase áurea, nos títulos de 58, 62 e 70. Quando sabíamos o time de cor. Fomos bicampeões, conquistamos a Taça Brasil (escala os times). Ainda tínhamos Nei e Afonsinho no banco. Na Copa de 70, foram cinco alvinegros. Eu conto o Gérson, que estava no São Paulo. Mas foi formado no Botafogo. Depois, fui para o Fluminense. Fomos bicampeões carioca, campeão do Torneio de Paris, fomos a duas semifinais de Brasileiro.

Dá para apostar em algum deles hoje?
Não, não, não! São fracos. Dois times fracos. No Botafogo, o melhor é o Seedorf, um jogador de 37 anos. O Fluminense é uma enfermaria. Deco e Fred só vivem machucados. E é essa a história do futebol carioca hoje em dia. O futebol do Rio está morto. O do Brasil segue o mesmo caminho. Estamos 12 anos sem ganhar nada.

Você viu a reabertura no Maracanã?
Brincadeira. Só rindo. O Ronaldo não tem história no Maracanã. É carioca, de Bento Ribeiro, mas tem o que contar no Mineirão, em Eindhoven, no Nou Camp, no Tatuapé. E o outro (Bebeto) é baiano, coordenador das divisões de base da CBF (o jogador já deixou este cargo), membro do COL (Comitê Organizador do Mundial. Qual o carisma que ele tem para tamanha representatividade? O Rio não dá valor a seus artistas. Não se ouve falar de Jairzinho, Carlos Alberto Torres, Paulo César Lima. E aí chega um tal Fenômeno, de outro estado... Que porra é essa? Onde estamos? Cadê o Zico, o Amarildo, o Romário. O Carioca não tem memória e é o povo mais racista do país. Estou de saco cheio.

Como tem visto o futebol brasileiro?
Parou no tempo. Como vou engolir que trazer Felipão e Parreira é novo? Só falta ressuscitar Vicente Feola, Aymoré Moreira e juntar com o Zagallo. O Felipão só quer saber de não deixar a defesa desprotegida. Antes, o europeu tinha medo da gente. Ao Parreira, o Brasil deveria dizer: muito obrigado, valeu, vai tocar seus negócios. E chega dessa história de Família Scolari.

Qual a sua opinião sobre o Neymar ?
O Brasil não tem outra alternativa de jogo. É só com ele. O técnico da seleção não cria nada diferente. Na boa, no Brasil, só o Cuca tenta. Embora, escale dois volantes que baixam a porrada. Não vejo o Brasil com ousadia para resgatar o futebol. E aí querem eliminar o Ganso, o que é brincadeira. O Neymar é a estrela isolada.

Você, então, acha que o Brasil perdeu a essência?
Me responde uma coisa: por que o Brasil pode colocar três cabeças-de-área juntos e não três, quatro, cinco craques? Por que não põe Oscar, Neymar, Lucas e Ganso juntos, com um centroavante hábil? Nos superávamos a Europa com a arte, com a ginga. Como o Fernando (Grêmio) vai sair para o drible? Nossa Senhora... Somos dependentes da individualidade do Neymar. E o Fred não pode ser esse centroavante. Já foi. Não tem mobilidade. O Pato não dá para contar. Vive machucado. Eu até improvisaria. Meu time teria Neymar na ponta esquerda, Ganso na meia, Lucas na ponta direita, Oscar na meia e um camisa 9. Como marcar cinco? Os europeus iam à loucura. Hoje, bloqueiam o Neymar e acabou.

Se não for assim, o hexa está distante?
A gente tem que parar de depender da genailidade de um só. Em 94, foi o Romário. Chega. Isso não acontece sempre. Mas também, né. Falar o quê de um futebol que comandado por José Maria Marin, Marco Polo del Nero e Andrés Sanchez?

Qual é a saída?
O Brasil precisa trazer ex-jogadores para trabalhar, ensinar. Assim fez a Espanha, a Alemanha... A Espanha era Fúria por que ia babando para cima dos outros. Aí, trouxe Rinnus Michel, Cruyff para ensinar. Foram introduzindo o futebol. Está aí o Barcelona. Na Alemanha, o Bayern tem Beckenbauer, Paul Breitner, Rummenigge. Onde está o Bayern? Já no Brasil, o futebol é comandado por preparadores físicos. É Mano Menezes, Oswaldo de Oliveira, Parreira.. Nunca perderam a cabeça do dedo chutando bola na rua. Tem uma coisa em comum a todos, pode notar. Esses preparadores físicos trabalham sempre com ex-jogadores razoáveis. Um Torres da vida não vai ser pau mandado de algum desses, né. Se coloca alguém capacitado, não tem como dar ordem. O Mano tem o Sidnei, que foi um volante. Do Scolari, é o Murtosa. O Parreira teve o Zagallo como tutor.

E os salários são bons..
Parece que existe um esquema. O cara é contratado, assina por dois, três anos e é demitido. Vai e recebe multa rescisória altíssima. Virou um vício, uma pouca vergonha. Como ganham dinheiro esses caras que nunca deram um chute na bola.

Qual o time bom no mundo, então?
Gosto do Barcelona, Borussia, Bayern de Munique e Arsenal. O Arsene Wenger implantou toque de bola no Arsenal.

Seria a causa do público não ir ao estádio?
Como você quer que o torcedor vá assistir futebol no Rio de Janeiro? Não tem artista. Além disso, o Engenhão é mal localizado.

Com a história que você tem na França, tem sido procurado para indicar jogadores?
Zero. Isso me entristece. Conheço o Daniel Hetcher, fundador do PSG. Até hoje vou à França e fico na casa dele. Ele, na década de 70, me convidou para ir ao PSG, mas lá não tinha ppraia. Fui para o Olympique. Fui para Marselha. Não indicaria nenhum brasileiro atualmente.

Recentemente, o Lula Pereira disse para a Revista Placar que o futebol brasileiro tem preconceito com os negros. Vê por aí?
 E muito. Nunca tivemos um treinador negro na seleção. E vem lá da década de 30. Leônidas era negro. Zizinho foi outro. E o Didi? Teve de comandar o Peru, a Turquia.. O Pelé nunca foi chamado para a seleção. Cadê o Djalma Santos? O Claudio Adão jamais teve oportunidade. Cadê o Andrade, que foi campeão brasileiro?