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Controle sobre organizadas cresce no Brasil, mas ainda não é o ideal


Sem apoio do governo federal, Federações e autoridades locais tentam se virar


Igor Siqueira - Rio de Janeiro (RJ)
 
Sinalizadores e material pirotécnico não faltaram no espaço destinado à torcida do San Jose na última quarta-feira (crédito: Rodrigo Vessoni)


O episódio na Bolívia, onde um torcedor morreu ao ser atingido por um sinalizador, reacende a discussão sobre como as torcidas organizadas têm sido tratadas no Brasil. Em geral, as medidas ainda são paliativas, como a suspensão imposta pela Federação Paulista à facção Camisa 12, do Corinthians, por usar sinalizadores no jogo contra o Botafogo-SP.

Mas a luz no fim do túnel começa a surgir quando os dirigentes passam a entender que cadastro de membros das organizadas e controle de atividades têm o poder de diminuir a violência (veja abaixo).
Diante da inércia do Ministério do Esporte, que chegou a iniciar o programa Torcida Legal, mas não o levou adiante – já que ele foi interrompido após o Tribunal de Contas da União barrar a licitação por suspeita de superfaturamento – algumas Federações estão se mexendo para resolver o problema.
O Ceará, por exemplo, tem um processo estabelecido para controlar e saber quais membros das organizadas entram nos estádios.

– Já tivemos até frutos desse trabalho. Na confusão que teve ano passado, quando torcedores do Fortaleza atiraram cadeiras no gramado no jogo contra o Oeste, pela Série C, identificamos e ajudamos a punir 33 envolvidos – contou o presidente da Federação local, Mauro Carmélio.

Só que o sucesso do cadastro do Ceará ainda não se estendeu ao país inteiro. Goiás e Pará, que historicamente sofrem com as facções, optaram por dar suspensões. Já no Rio Grande do Sul, tem organizada que se recusa a ser cadastrada e o controle é um desafio para as autoridades.

Mas se não há uniformidade de medidas, ao menos a preocupação com o controle das organizadas está crescendo no país da Copa de 2014.

1997: Rojão e morte em BH
A prática costumeira das torcidas organizadas de jogar rojões, fogos e bombas em direção aos adversários já fez uma vítima no Brasil. O caso foi em outubro de 1997. O jogo era Cruzeiro x Vasco, mas houve confronto entre a principal organizada da Raposa e a do Atlético-MG. Uma bomba foi atirada em direção aos atleticanos e Claudemir da Silva Reis, de 16 anos, acabou morrendo.

Autor do arremesso, Múcio dos Reis Ribeiro chegou a ser condenado a 15 anos de prisão pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, mas recorreu em liberdade. Em 2008 ele chegou a ser preso. Atualmente, Múcio é o presidente da Máfia Azul.

Violência no futebol já matou 193
O número de vítimas da violência causada pelas torcidas já chegou a 193, segundo levantamento feito pelo L!Net. A contagem começou a ser feita a partir de 1988, quando houve a primeira morte ligada a confrontos entre facções: o presidente da Mancha Verde, Cleo Sostenes, em São Paulo, que levou tiros de corintianos.

Com a palavra
José Luiz Portella - Colunista do Lance!

Cadastro identificaria núcleo de baderneiros
É um mistério a questão das torcidas organizadas não ter sido resolvida ainda. Quem promove uma desordem é um núcleo das facções, não ela toda, e são sempre os mesmos. Se fossem cadastrados, já seriam facilmente identificados pela inteligência das polícias.

O problema é que há uma cultura de permissividade aqui no Brasil e ninguém toma atitude. Quando acontece uma fatalidade, como a da Bolívia e outras, fica todo mundo consternado na internet e depois de quatro dias de “luto”, volta tudo ao normal.
As autoridades só tomam medidas para criar manchetes e não levam nada à frente. Não sei o porquê de não haver vontade política para acabar com o problema. A Inglaterra conseguiu a paz porque focou no grupo específico de baderneiros, que eram os hooligans.


COMO ESTÁ O CONTROLE DAS ORGANIZADAS NO BRASIL


Região Norte
O estado do Pará é o que tem mais problemas com organizadas por causa da rivalidade Remo x Paysandu. Mas o Ministério Público já proibiu em definitivo a presença de cinco das principais facções nos estádios. O cadastro dos membros das organizadas que restaram é feito por elas mesmas e repassado às autoridades.

Paraná
A pancadaria ocorrida na partida entre Coritiba e Fluminense, pela última rodada do Campeonato Brasileiro de 2009, acelerou o processo para o cadastro das torcidas organizadas. No entanto, os problemas seguem existindo, apesar da ação das autoridades e dos próprios clubes, que fazem controle na entrada dos estádios.

Rio Grande do Sul
O cadastro das torcidas é feito pelos clubes, que repassam para a Federação Gaúcha de Futebol (FGF), Polícia Militar e Ministério Público. A FGF estuda implantar, ainda em 2013, um cadastro próprio. O presidente da entidade, Francisco Novelletto, defende a criação de uma lei específica para as organizadas do país.

Goiás
O cadastro ficou de lado porque o Ministério Público conseguiu uma liminar que suspende a atuação das organizadas na cidade Goiânia por tempo indeterminado, mesmo que elas sejam de clubes de outros estados. O MP tenta na Justiça a suspensão das facções por até 5 anos. Hoje, não se pode fazer qualquer referência às facções.

São Paulo
A Federação Paulista retomou no ano passado o processo de cadastramento dos membros das organizadas. A atuação é itinerante e existe um cronograma para atender, inclusive, às facções de times do interior do estado. A empresa BWA foi contratada para o serviço e recebe R$ 14 mil por mês da Federação.

Minas Gerais
O Ministério Público já solicitou que todos os torcedores sejam cadastrados. Segundo o presidente da Federação Mineira, Paulo Schettino, o processo ainda não terminou e os membros das organizadas entram nos estádios sem serem identificados. Mas ao menos há um Termo de Ajuste de Conduta assinado pelas facções.

Ceará
O cadastro de torcedores já está pronto e a identificação na entrada do estádio já está ativa. No entanto, ainda não há um processo biométrico, mas isso é um plano da Federação Cearense. Cada torcedor tem seu próprio cartão e precisa apresentá-lo na entrada do estádio. Ministério Público, polícia e Federação têm acesso aos dados.

Pernambuco
A Justiça proibiu a presença de organizadas de Sport, Náutico e Santa Cruz nos estádios por tempo indeterminado. As autoridades pretendem ainda iniciar o programa de cadastramento, cuja expectativa para começar é de 60 dias e o custo estimado é de R$ 1 milhão. Só com cadastro é que o torcedor poderá entrar no estádio.

Bahia
Exigência do MP-BA, o controle de torcedores ainda não está em ação na porta dos estádios, mas a Federação diz que está coletando dados dos membros das organizadas desde o fim de 2012. A expectativa é que ele essa parte esteja finalizada até o início do Brasileiro. Enquanto isso, reuniões pré-jogo vão mantendo a ordem.

Rio de Janeiro
Clubes e Federação, com o apoio do TJ-RJ, já desenvolveram o projeto para iniciar o cadastro dos torcedores membros de organizadas, mas os planos não saíram do papel pela falta de patrocinadores ou uma maneira viável de custeio. Cada um teria um cartão personalizado e depois viria a identificação biométrica.

Santa Catarina
O cadastramento das organizadas começou a ser feito em 2010, após uma iniciativa da própria Federação Catarinense de Futebol (FCF). Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e Ministério Público trabalham juntos e a violência entre as torcidas tem sido menor. Neste ano ainda não houve qualquer tipo de problema.