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‘Tenho o Botafogo no coração’, diz Levir Culpi, que reencontra o ex-clube

Levir Culpi revela que quase se aposentou após a conquista da Copa do Brasil

Levir Culpi revela que quase se aposentou após a conquista da Copa do Brasil Foto: Douglas Magno / AFP
Marluci Martins

A aposentadoria está cada vez mais próxima e quase se concretizou após o apagar das luzes da conquista da Copa do Brasil. Levir Culpi decidiu renovar por mais um ano com o Atlético-MG, mas já não suporta o modelo falido do futebol brasileiro. Em entrevista ao Jornal Extra, ele criticou os clubes do Rio e confessou estar sofrendo com o rebaixamento do Botafogo, seu adversário deste domingo, às 17h, no Mané Garrincha, em Brasília. Ex-zagueiro do Botafogo nos anos 70, Levir voltou ao clube em 2003 para devolvê-lo à Série A do Brasileirão. Hoje, ele sofre com o rebaixamento do Alvinegro e, também, com o “atraso” do futebol carioca, “uma esculhambação”.


Por que você disse, após a conquista da Copa do Brasil, que tinha fechado a conta?
Fechei a conta de 2014. Acabou o peso, acabou a panelada. Férias!


Ficou parecendo que planejava se aposentar...
Na verdade, isso passou pela minha cabeça: “Será que devo parar depois de uma conquista dessas?” Mas é passageiro. Depois de 15 dias, você fica nervoso, vê jogos feito um louco... Não me preparei para parar.


A profissão é cansativa?
Não vou dizer que cansa. Mas não preciso mais passar por isso. São situações que a gente passa no futebol que me fazem pensar em parar. Também deve acontecer com você na sua profissão.


Por exemplo?
Todos os times do Brasil estão devendo. Muitos deles, à beira da falência. Sinto vontade de parar, mas não consigo. Só que desanima...


Seu salário está em dia?
Nenhum time do Brasil está em dia. Ou melhor: parece que o Criciúma e a Chapecoense estão. Mas 99% não estão em dia. A crise é geral, está estabelecida, não conseguem pagar.


O Atlético já te deve há quanto tempo?
Só falo que está atrasado. Vamos mudar de assunto.


A solução pode ser o exterior?
Mas já saí. Fiquei seis anos no Japão. Estou curtindo o futebol, me divertindo, mas ao mesmo tempo fico triste. Faço parte de uma minoria de 5% da população do futebol que é independente financeiramente. Sinto-me agradecido por isso, me dá certa tranquilidade, mas, desculpa, não é justo. Eu gostaria de sair do Brasil, mas para uma jornada diferente. Estados Unidos, Austrália, um time europeu ou algo novo que me desse adrenalina.


Por que renovou o contrato com o Galo?
Renovei porque no Brasil, se eu tivesse que continuar, seria no Atlético. No Brasil, só o Atlético. Já estou no clube há mais de seis meses e posso começar uma melhor pré-temporada.


Você foi treinador do Botafogo. Tem algo a receber?
O Botafogo não me deve nada. Vou te dizer: tenho o Botafogo no coração porque joguei lá em 1972, num time de craques. E, depois, voltei ao clube como treinador (em 2003) para levá-lo de volta à Série A. Tenho carinho, conheço a história do clube e não posso admitir que esteja passando por essa situação. Estou sentindo uma certa dor por isso. Quando saí de lá, o (presidente) Bebeto (de Freitas) me chamou e pediu que eu entrasse na Justiça para receber o que me deviam, porque não havia recursos. Ele me autorizou, pois entendeu que seria o caminho mais fácil. O dinheiro saiu dez anos depois. Não era tanto assim, mas recebi somente no ano passado.


Que lembrança tem de quando jogava no Botafogo?
Aos 18 anos, eu era reserva da dupla de zaga: Brito e Osmar Guarnelli. O time tinha Zequinha, Jairzinho, Ferretti, Nei Conceição, Carlos Roberto, Maurinho Chagas...


Como se sente por ter de enfrentar o Botafogo?
É uma pena ter que jogar contra o Botafogo, mas é uma questão de profissionalismo. Não é que seja doloroso, mas é desconfortável. Não me sinto bem. Não fico acompanhando o time, mas torço.


Fica magoado por ver a seleção sendo comandada pelo Dunga, que tem menos experiência do que você?
Conhecendo a cultura do Brasil, não me surpreendo com nada. Não tenho sentimento nenhum, a não ser de expectativa porque tudo pode acontecer dentro do futebol. Tudo pode acontecer, até mesmo o Brasil dar certo com ele e não perder mais. Ou dar errado e perder tudo. No Brasil, nada funciona bem. É um país mal-educado. Enquanto não tivermos educação boa, não teremos sucesso em nenhum segmento.


Gostaria de treinar a seleção?
Ficaria feliz, pois estaria trabalhando com os melhores do mundo, embora saiba que a dificuldade é grande. Mas, veja bem, considero o Dunga um cara honesto, vencedor, do bem. Sou amigo do Gilmar Rinaldi e torço para que tudo corra bem, pois sei o que eles passam.


Considera-se injustiçado?
Sou o cara mais justiçado do mundo porque deixaram eu jogar até os 32 anos, e ainda sou técnico, aos 60.


Qual é o melhor time do País?
O meu time é o melhor.


E o Cruzeiro?
Falando sério? (Risos). O Cruzeiro está na frente do Atlético, sim. É mais organizado e regular. Mas o time que passou mais emoção foi o Atlético.


E o craque do Brasileirão?
Foi o Tardelli. Tivemos uma diferença lá atrás, mas nos acertamos. Fiz uma substituição, ele não gostou. Houve uma discussão... Ele estava numa fase esquisita, sem fazer gols, mas desandou a fazer e tudo ficou em ordem. Já treinei o pai dele, o Tadeu, no Paraná. Fomos campeões. Agora, quero treinar o filho do Tardelli. Costumo dizer isso a ele (risos).


Qual é a diferença entre o futebol carioca e o mineiro?
A diferença é muito grande, a favor de Minas. O Rio é um dos estados mais atrasados no futebol. É inadmissível a falta de centros de treinamento. Uma esculhambação total. O Rio é o pior exemplo que temos no futebol brasileiro. O que me deixa triste, porque é uma referência mundial. As pessoas estão desonrando a tradição dos clubes cariocas, que foram grandes e, hoje, são só lembranças.


Planeja trabalhar por mais quanto tempo?
Não tenho uma referência. Renovei por mais um ano.


O Atlético é o time da virada. Seu coração está suportando bem tanta emoção?
Meu coração está alinhado com o do atleticano. Tenho uma arritmia, mas descobri isso no início do ano, sem estar trabalhando, de férias. Agora, estou aperfeiçoando minha arritmia (risos). Tomo remédio. Não tenho me sentido mal.


Acha que a arritmia tem a ver com sua profissão?
Não! Acho que a arritmia tem a ver com o meu casamento (risos).