Após parada forçada para descansar, Maurício Assumpção diz em entrevista que foge de blogs e comunidades do Botafogo na internet para não se irritar
Maurício Assumpção em seu gabinete no Botafogo
(Foto: Gustavo Rotstein/Globoesporte.com)
(Foto: Gustavo Rotstein/Globoesporte.com)
Até assumir a presidência do Botafogo, em janeiro de 2009, a experiência de Maurício Assumpção com o futebol de campo se resumia à atuação nas divisões de base do Anápolis-GO e a testes no Goiás, no Atlético-GO e no próprio Alvinegro. Mas bastaram dois anos no comando de um dos maiores clubes do Brasil para que o cirurgião dentista de 48 anos sofresse o estresse que acarreta o lado nem tão mágico da política. Por recomendação médica, se afastou de General Severiano por dez dias, no início de 2011. Além da busca pela saúde, ainda se vê às voltas com a conciliação entre rotina de trabalho, vida pessoal e o mundo do futebol.
Embora garanta que transferiu para o campo muito da filosofia adotada na administração e prática do futebol de praia, Maurício Assumpção reconhece que, nos últimos dois anos, ganhou alguns truques necessários para viver num mundo que, muitos dizem, está cheio de "raposas". Em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM em seu gabinete, em General Severiano, o presidente do Botafogo afirma ainda não ter decidido sobre se candidatar novamente, ou não, para as eleições de novembro e revela considerar algumas alternativas, seja em 2011 ou num futuro mais distante.
- Até oferta para entrar na política eu já tive, e era algo que nunca havia passado pela minha cabeça. Depende de qual é o objetivo - disse.
No início de janeiro o senhor se afastou do Botafogo por dez dias por recomendação médica. O que aconteceu?
Depois que entrei no Botafogo, engordei 20 quilos e cheguei a 103. Para uma pessoa de 1,70m, alguma coisa está errada. Passei a ter uma vida sedentária, sem fazer muitos exercícios. Sempre joguei bola e andei na praia. Estava estressado, me irritando com facilidade, sem dormir direito e senti que não estava funcionando direito. Fui ao médico, e o hemograma e o teste de esforço não deram bons resultados. Além disso, no Natal perdi um amigo de 47 anos, vítima de um infarto fulminante. Então, comecei a ligar alguns sinais de alerta.
E o que o senhor fez neste período de recesso forçado?
Viajei para tirar férias com meu filho de 18 anos e com a família da minha irmã. Realmente descansei. Estava num hotel e aproveitei para fazer uma reeducação alimentar, o que é muito complicado, pois há sempre reuniões com almoços e jantares. Desde então perdi seis quilos e venho caminhando na praia três ou quatro vezes por semana. Foi bom para entender que preciso de um tempo para mim. Ou fazia isso ou meu trabalho não renderia mais. Além disso, meu estresse vai todo para a comida. Quando estou nervoso, ataco a geladeira.
E o que mudou em sua vida desde que entrou no Botafogo? Pensou que seria mais simples?
Sabia que seria duro, não sabia se conseguiria conciliar a presidência do Botafogo com minha atividade profissional. No início, o consultório foi bem complicado. Hoje conto com uma outra profissional que faz plantão para mim nas sextas-feiras, enquanto eu atendo outros dias. Em breve vou fechar uma sociedade com um colega, o que vai me dar uma tranquilidade financeira muito grande. Continuo dando aulas numa universidade do Rio e em outra de Nova Friburgo. Precisei reduzir minha atividade em quase 50%, mas não posso abrir mão.
Há dois anos, no início do seu mandato, o senhor disse que nunca comparecia a uma reunião sozinho. Continua adotando essa prática? Sente-se mais seguro?
Continuo sem ir sozinho a uma reunião. Estou mais seguro, mas quero estar perto de pessoas que saibam mais do que eu em áreas específicas, porque estou falando em nome da instituição. Por isso, não posso me dar o direito de cometer erros ou de deixar de fazer um negócio melhor para o Botafogo. Quando me ligam para propor um negócio, logo encaminho para o setor responsável. Também não trato de assuntos ligados ao futebol. Não sou quem fecha um negócio.
Muito se fala que o futebol tem negócios por baixo dos panos, que dirigentes ganham dinheiro na negociação de alguns jogadores. Já chegou até o senhor uma proposta desse tipo?
Nunca conversei com empresário e nem tratei de negociações do futebol. O clube conta com funcionários designados para isso. Quando você mostra ao mercado a sua forma de atuar, as pessoas falam de outra forma. Não existe abertura para esse tipo de proposta. Isso vale para a negociação de placas no Estádio Olímpico João Havelange, entre outras coisas.
Desde que surgiu como candidato, no fim de 2008, muito se falou do fato de o senhor ser um novato no mundo do futebol. Sentiu muitas dificuldades de adaptação?
Existe o mundo mágico do futebol, que é correr atrás, batalhar e montar um time. Mas há as chateações e a realidade."
Maurício Assumpção
Algumas pessoas desdenham do meu histórico no esporte, mas ele ainda me serve muito. Desde 1983 tenho uma ligação com o futebol de praia. Joguei e fui presidente de liga. Naquele ambiente, saí do nada para ser vencedor e fiz isso com parceiros que entendiam daquilo e que me diziam o que estava errado. O universo de onde vim é menor, mas tem situações semelhantes às do futebol profissional. Os princípios da praia me norteiam ainda hoje. Por isso, estou ao lado de pessoas capacitadas e que não dizem amém para tudo o que eu falo. Cada departamento tem uma atuação autônoma integrada a um contexto filosófico. Todos têm a mesma importância.
E que a habilidades criou neste novo universo?
O princípio básico é a honestidade. É preciso dizer a que veio, o que quer e saber o que o clube precisa. Não dá para mentir, porque no dia seguinte se descobre tudo. O importante é ter sinceridade.
É fácil viver no mundo do futebol e manter a rotina?
É uma realidade social e financeira muito diferente da minha. São números astronômicos. É preciso ter pessoas críticas ao lado, principalmente a família, para segurar a onda. Tenho uma vida social simples e não perdi isso. Continuo indo à praia, ao cinema e ao teatro. De vez em quando coloco uma bermuda e vou ao bar jogar conversa fora. Existe o mundo mágico do futebol, que é correr atrás, batalhar e montar um time. Mas há as chateações e a realidade. Falta dinheiro, o time perde de goleada e a torcida quer te matar, luta contra o rebaixamento...
E as críticas?
Tive que arrumar defesas para isso. Por exemplo, não entro mais em blogs e comunidades (do Botafogo na internet), porque publicam opiniões agressivas à sua pessoa e ao seu caráter. Depois de ler, dá vontade de dar um tiro na cabeça. São pessoas que se colocam atrás de logins e escrevem atrocidades. Pouco antes de iniciar o mandato, me mandavam e-mails dizendo que eu poderia ser preso se não honrasse os compromissos do Botafogo. Gente ligada ao clube apostou que eu não aguentaria três meses na presidência. Dos amigos, ouvi que me ajudariam no que eu precisasse.
Qual a sua maior conquista até o momento?
Se tivesse que apontar um feito do qual me orgulho, seria o de reaproximar do clube pessoas que ajudam simplesmente pela paixão. São parceiros de situação excelente que amam o Botafogo. É um orgulho para mim, não como pessoa, mas como instituição. Sei que se esse trabalho continuar, independentemente de eu estar aqui, ou não, eles vão seguir ajudando.
O Botafogo terá eleições para presidente em novembro. Vai se candidatar à reeleição?
A decisão ainda não está tomada. Há mais um ano pela frente, e o futebol é dinâmico. Por exemplo, até o início do Mundial de Clubes, ninguém questionava a gestão do Vitório Piffero. Foi só o Internacional perder para o Mazembe... O futebol é ingrato. Existem ainda questões pessoais que vou avaliar.
Seja como presidente ou não, pretende seguir carreira no futebol?
Vai depender das propostas que eu tiver. Até oferta para entrar na política eu já tive, e era algo que nunca havia passado pela minha cabeça. Depende de qual é o objetivo. Por enquanto, quero pensar no que estou fazendo, pois ainda tem muito trabalho pela frente.