Ironizado, teto do Engenhão tem relatório cru. Projetista se defende
Prefeitura apresenta imagens de obras na estrutura, mas não detalha estudos. 'Fotos são iguais às de relatório de 2007', diz autor do projeto
A prefeitura convocou uma coletiva de imprensa às pressas esta manhã de
sexta-feira para apresentar um relatório dos novos serviços para
finalmente reabrir o Engenhão. O prazo para finalização das intervenções
- que consitem em escoramento da estrutura, reforço dos arcos e outras
peças secundárias - é de um ano e meio (18 meses). Mas pouco foi
explicado sobre a metodologia utilizada para comissão especial de
avaliação do estádio e o Consórcio Engenhão, formado pela Odebrecht e
OAS, chegarem à conclusão de novas obras com duração de 18 meses. Nos
slides, apenas fotos e as etapas dos serviços que devem ser preenchidos.
Nenhum novo relatório com explicação dos dados contestados pelas
empresas canadenses e inglesas. Apenas fotos e imagens no telão. No fim
da concorrida entrevista - que durou cerca de 40 minutos -, a mesa já se
levantava para ir embora, mas atendeu a pedido de jornalistas e
permaneceu por mais cinco minutos no auditório da prefeitura, na Cidade
Nova.
A
foto da esquerda, tirada em posição inversa à da última terça-feira.
"Curvas da estrada de Santos" já existiam desde a inauguração do estádio
em 2007 (Foto: Montagem sobre fotos de divulgação)
O que se pretendia chamar mais a atenção na apresentação feita pelo
engenheiro da comissão Sebastião Andrade eram as fotos da vistoria da
última terça-feira (4 de junho). Todas imagens mostravam uma estrutura
metálica com deformações e outras falhas.
- As fotos deixam claro: o sistema está pedindo ajuda. Alguma coisa vai
acontecer com tanta movimentação do sistema. Algumas pessoas foram para
lá, outras para cá. Só Deus sabe o que vai acontecer. À medida que
chega a esse nível (de deformação), sai de perto - disse Andrade, na sua
explanação no início da coletiva.
O engenheiro Sebastião Andrade mostra um dos slides da comissão do Engenhão (Foto: Raphael Zarko)
- Mais parecem as curvas da estrada de Santos - ironizou, antes de voltar ao ponto inicial: que diante de toda a documentação exposta, todas entrevistas com todos agentes do processo, o reforço estrutural era imprescindível.
O GLOBOESPORTE.COM consultou o projetista da cobertura do estádio. O projeto de Flavio D´Alambert é considerado culpado pelas falhas da estrutura do teto do Engenhão. De posse das fotos divulgadas para a imprensa, D´Alambert logo contestou o relatório da comissão.
- As fotos apresentadas são idênticas às que fiz em 2007, quando liberamos o estádio. Uma delas (refere-se à do teto em "curvas da estrada de Santos") só foi tirada no ângulo contrário. Eu tirei da esquerda para a direita, eles da direita para a esquerda - lembra D´Alambert, responsável pela cobertura de dois outros estádios da Copa de 2014: Castelão, em Fortaleza, e Arena Pantanal, em Cuiabá.
D´Alambert mantém a posição: os reparos tinham
que ser feitos anteriormente(Foto: Raphael Zarko)
que ser feitos anteriormente(Foto: Raphael Zarko)
A Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural (Abece),
através do vice-presidente Jefferson Dias de Souza Junior, disse que
ainda vai esperar a divugalção de um relatório completo da comissão para
"eventualmente" se pronunciar.
- O que queríamos ao contratar a empresa inglesa BRE, que contestou o
relatório dos alemães da SBP e que interditou o Engenhão, era contribuir
com os cuidados da segurança do estádio. A SBP tinha usado medidas de
carregamento que davam outra impressão sobre os riscos mínimos à
estrutura do Engenhão. E a BRE referendou os canadenses, referendou o
estudo do projetista. Se o novo laudo encontrou motivos para uma
interferência grandiosa, se foram detectados problemas mais profundos,
queremos ver para depois nos posicionarmos - disse o vice-presidente da
Abece.
Marcos Vidigal, engenheiro da Odebrecht e representante do Consórcio
Engenhão, lembrou que não havia consenso das medições nem entre
D´Alambert e o verificador, a empresa portuguesa TAL, que realizava
inspeções antes da entrega do estádio. O projetista contesta.
- Não eram divergências. Mesmo que cada um desse sua opinião, nós
sempre convergíamos para a análise mais crítica. Mas o que sempre ficou
muito claro é que deveria ter havido um monitoramento que, pelas fotos
que estou vendo, parece que nunca aconteceu. Se hoje precisa de um
grande reparo, é porque, infelizmente, nada ou muito pouco foi feito
antes. Deixei de vistoriar a obra após a entrega, em 2007, e fica claro
no relatório de manutenção: qualquer problema que houvesse, eu, o
projetista, deveria ter sido procurado. E nunca fui. Esse reforço, essas
intervenções poderiam ter sido feitas há muito tempo, sem a necessidade
de intervenção do estádio - diz D´Alambert.
As
deformações nas tesouras do estádio também estavam relatadas em
relatórios e em imagens: a foto da direita, ainda sem teto montado já
aponta falhas na cobertura do Engenhão (Foto: Divulgação)
Na coletiva de imprensa, os participantes foram unânimes em falar em
erro de projeto, da empresa de D´Alambert, a Alpha. O projetista se
defende novamente. Ele lembra que tudo foi analisado em conjunto por
todos agentes da construção.
- Todos critérios da engenharia brasileira foram usados. Todo mundo foi
consultado: fabricantes, construtores, engenheiros... Ninguém tem poder
sozinho de dar diretrizes numa obra dessa complexidade, desse tamanho -
lembra o projetista da cobertura do Engenhão.
Deputado pede relatório
Em outra esfera, o presidente da Comissão Externa de Legado da Copa e
das Olimpíadas, deputado federal Alessandro Molon, cobrou novamente da
prefeitura mais informações sobre a interdição do estádio e sobre as
intervenções finalmente definidas.
- Quase três meses depois da interdição do Engenhão, a prefeitura diz
que o estádio ficará 18 meses fechado, mas que não sabe nem quando a
obra começa nem quanto custará, é um atestado de incompetência. Os
laudos e estudos referentes ao Engenhão ainda não são públicos. A única
coisa pública é a vergonha nacional e internacional pela qual estamos
passando - disse o deputado, que enviou dois ofícios à Prefeitura do Rio
solicitando laudos e estudos sobre o estádio.
A assessoria do deputado informa ainda que na terça-feira, mesmo dia da
vistoria da comissão especial do Engenhão, o chefe da Casa Civil da
Prefeitura, Pedro Paulo, ligou para Molon e prometeu repassar ao
deputado até o fim desta semana os documentos.
- Até agora, no entanto, não recebemos nada - afirmou o deputado federal.