Total de visualizações de página



O capítulo final de Maurício Assumpção na presidência do Botafogo
À beira da Série B, time entra em campo para sua última partida sob o comando do dirigente que, após início promissor, acumulou desafetos

por Eduardo Zobaran






RIO - É difícil lembrar, mas Maurício Assumpção já exibiu ares de “popstar”. Em 2012, quando surfava a onda Seedorf, o prometido “craque para fechar aeroporto”, o presidente alvinegro tinha tratamento de ídolo. Em Macapá, quando foi prestigiar o Feijão do Fogão — evento criado para atrair sócios fora do Rio —, Assumpção foi às lágrimas ao ser recepcionado por torcedores no aeroporto como se fosse uma estrela do time. Mais tarde, formou-se uma fila para autógrafos tão longa quanto a que aguardava pela assinatura de Túlio Maravilha, artilheiro do último título nacional do clube, em 1995.


Hoje, quando o time entrar em campo, às 19h30m, para enfrentar a Chapecoense, em Santa Catarina, a Era Maurício Assumpção chegará ao fim após seis anos de dois mandatos. Na terça-feira, haverá eleições no clube, com quatro chapas, em que todas se dizem de oposição ao presidente. O novo mandatário assumirá imediatamente.

De forma melancólica, com dívidas entre R$ 700 milhões e R$ 780 milhões — em um clube com receita de R$ 100 milhões anuais —, o presidente poderá devolver o futebol alvinegro à Série B, repetindo a humilhação vivida no rebaixamento em 2002. Isso acontecerá hoje caso o Botafogo perca, e o Vitória vença o Figueirense, às 17h, no Orlando Scarpelli, também em Santa Catarina.

— Ele se descolou da realidade. Clubes têm orçamentos e enquadram suas despesas de acordo com as receitas — critica Carlos Eduardo Pereira, que ajudou a lançar a primeira candidatura de Assumpção, foi seu concorrente na reeleição seguinte e hoje é um dos quatro candidatos à presidência.

Em 2008, quando foi eleito, Maurício Assumpção chamava a atenção pelo perfil diferente dos dirigentes do futebol brasileiro. Morador de Copacabana, dentista e torcedor fanático, daqueles que abria seu consultório na madrugada para atender aos jogadores acidentados em jogos, ele ganhou a simpatia de quase todos. Após um primeiro ano em que escapou do rebaixamento graças a milagres de Jefferson e lampejos de Jóbson, o ano seguinte veio com a contratação de Loco Abreu e um título estadual sobre o Flamengo, com direito a cavadinha na última decisão do velho Maracanã.

— O grande erro foi abrir mão de um processo de profissionalização que vinha dando certo no primeiro mandato — ressalta o candidato Marcelo Guimarães, ex-diretor de marketing, demitido em 2013 e que usa um termo que ficou conhecido para se referir aos amigos do presidente, como Sidney Loureiro, ex-diretor de futebol, e o volante Rodrigo Souto. — Trocou o que tinha feito pela “Turma da praia”.


5% em contrato milionário
Passados seis anos desde que assumiu, Maurício, hoje com 53 anos, aparenta abatimento e cansaço, embora já não mais atenda em seu consultório. Para estudantes de marketing esportivo, dá aula sobre gestão de arenas, ainda que uma das maiores críticas seja a forma como conduziu a crise vivida pela perda do Engenhão. Filiou-se ao PMDB, partido de Eduardo Paes, Sérgio Cabral e do botafoguense Luiz Pezão, mas é difícil imaginar que hoje se elegeria a um cargo público.

No futebol, tem como principal aliado Rubens Lopes, presidente da Federação de Futebol do Rio, contestado por Flamengo, Fluminense e Vasco (antes da volta de Eurico Miranda). É desafeto de clubes como Atlético-MG, que acredita que Maurício, ao ajudar a implodir o Clube dos 13 de olho em maiores recursos para o Botafogo, não se atentou para o fato de que aumentava a disparidade financeira entre Flamengo e Corinthians e os demais. Fora do futebol, foi este ano às lágrimas diante da presidente Dilma Rousseff ao falar sobre a crise alvinegra.

Negócios polêmicos
Nada manchou tanto sua imagem quanto a revelação de que uma empresa de seu pai, falecido no ano passado, receberia 5% de comissão no contrato com a Guaraviton, patrocinadora do Botafogo desde 2010. Só na atual temporada, a Guaraviton investiu mais de R$ 20 milhões.
— Foi imoral e antiético — condena o candidato Vinícius Assumpção, que faz questão de ressaltar não ter parentesco com Maurício. — As pessoas dizem que não foi ilegal, mas foi. Ele usou a empresa do pai. É nepotismo.

Essa não foi a única polêmica envolvendo patrocínios. No início do ano, fechou contrato com a TelexFree, denunciada por operar esquema de pirâmide investigado no Brasil e nos Estados Unidos. O acordo tentava minimizar os problemas financeiros, fortalecidos com a saída do Ato Trabalhista por não cumprir acordo com a Justiça do Trabalho. No fim de seu mandato, as penhoras se tornaram recorrentes.

Em 2014, poucos meses após ver o Botafogo na Libertadores depois de 18 anos de espera, deixou de ser assíduo nos jogos, com receio da reação da torcida. Nem aos treinos ia, coisa que só voltou a fazer após a demissão de Emerson, Bolívar, Edílson e Júlio César. Esses foram os jogadores que, ao lado do ídolo Jefferson, titular da seleção brasileira, participaram de reuniões com o ex-presidente Carlos Augusto Montenegro para que uma cúpula de torcedores milionários quitasse as dívidas com o elenco.

— Ele optou pelo isolamento. Confiava em pouquíssimas pessoas para a troca de ideias. Isso aumenta a margem de erro — reclama Thiago Cesário Alvim, que foi vice-presidente de Comunicação de Assumpção e deixou a diretoria para se candidatar à presidência.


Adesivo: ‘Pior da História’
Entre os poucos elogios à sua gestão, está a valorização das divisões de base do clube, que revelou jogadores como Dória, Gabriel e Vitinho. Apesar disso, sua maior promessa, a construção de um centro de treinamento para os jovens, jamais saiu do papel. No clube, frequentadores da sede social também observaram melhorias na estrutura.

Na terça-feira, a oposição promete criar um clima hostil para a presença do dirigente. Foram confeccionados 1.500 adesivos com os dizeres “O pior presidente da história”, título historicamente de Charles Borer, que vendeu a sede de General Severiano em 1977. Já há adesão de integrantes das quatro chapas. Há mais de dois meses que Maurício Assumpção é procurado pela reportagem e protela um pedido de entrevista.