Por Mariana Kneipp e Pedro Veríssimo
Rio de Janeiro
Maicosuel é o Mago. Caio, o Talismã. Agora, surge Merlin. Direto da República do Congo para Niterói (RJ), um jovem atacante que divide o nome com o famoso feiticeiro treina no time de juniores do Botafogo e espera uma oportunidade para formar uma trinca mágica alvinegra. Aos 20 anos, o menino quer seguir os passos do amigo Caio e usar seus truques para parar o tempo e ganhar uma vaga no elenco profissional até o fim de seu contrato, em dezembro de 2010.
Ao contrário dos brasileiros, os congoleses não são tão apaixonados por futebol. Apenas durante a Copa do Mundo, alguns torcedores mais interessados param em frente à televisão para assistir aos melhores jogadores do mundo. Merlin foi um deles em 2006. O menino, então com 16 anos, sentou ao lado do irmão e da mãe e viu a Seleção Brasileira na tela mágica. Ainda na mesa de jantar, a dona da casa disse aos filhos:
- Os melhores jogadores do mundo estão no Brasil. Se vocês forem para lá e se destacarem, eu realmente vou dizer que são bons.
Merlin pede oportunidade para Joel no time
(Foto: Pedro Veríssimo / Globoesporte.com)
A mãe ainda não acreditava no talento de Merlin e seu irmão. Mas ouviu a promessa do primogênito de que não iria se arrepender de sua decisão de permitir a viagem dos ainda menores de idade para o país distante. Pouco tempo depois, os dois chegaram à casa do tio, que era diplomata em Brasília.
- Tudo era muito difícil. Não sabíamos falar a língua, não conhecíamos ninguém. Só que a gente tinha uma vontade muito grande de crescer. Quando você sai de um lugar e faz uma promessa para alguém, tem que se dedicar para alcançar isso. Eu precisava cumprir - contou Merlin, que tem o francês como idioma natal.
Brasília, no entanto, ainda não era o destino final do jogador no Brasil. Confiante em seu talento, o congolês decidiu que precisava ajudar a si mesmo. Durante dois meses, assistiu a vídeos de treinos físicos e táticos na internet e ficou imitando no campinho que tinha em seu prédio. Quando já estava "bom nos treinos", chegou a hora da autopromoção, colocando seus próprios movimentos de embaixadinhas na web.
- O pai de um amigo viu o vídeo e disse que iria me ajudar. Ligou para o meu empresário atual e conseguiu que eu viesse para o Botafogo.
Merlin é como um irmão para mim. Gente boa demais"CaioFoi o momento da virada. O menino, que antes jogava como goleiro, foi para a linha e passou no teste do Alvinegro carioca. No alojamento em General Severiano, conheceu aquele que seria seu amigo nos juniores e depois: Caio, o talismã de Joel Santana.
- Merlin é como um irmão pra mim. Gente boa demais. Nos primeiros dias em que treinei entre os profissionais, passei mal e ele me ajudou muito. Rezou por mim e me ajudou em tudo o que precisei. Sou muito grato a ele por essa convivência – contou Caio, lembrando que brincou com as trancinhas do cabelo do amigo quando ele chegou para o primeiro treino.
Lesões atrasam evolução de Merlin
Merlin treina ao lado de Caio (à direita) (Foto:
divulgação / site oficial do botafogo)
Merlin quer seguir os passos de Caio e poder colocar na prática a dança especial de comemoração que treinavam quando o Talismã ainda era do time de juniores. Mas o destino anda pregando peças no menino do Congo. Depois de esperar bastante pela liberação de sua documentação, o atacante foi parado pelos problemas médicos.
- Não tive muita oportunidade ainda. Fui chamado no final de um jogo, mas o adversário estava marcando muito, então não joguei bem. Ia começar contra o Madureira, mas, na véspera, passei mal à noite. Já contra o Americano, fui bem. Aos 15 do segundo tempo, entrei e marquei o gol na primeira bola. Depois, recebi uma falta, caí mal e já senti o joelho. Era muita dor. Fiz a ressonância magnética e soube que teria de fazer uma cirurgia - contou.
Sempre ao seu lado, o treinador do time de juniores do Botafogo, Douglas Oliveira, lamentou a falta de sorte do pupilo. Para ele, Merlin, que deve voltar a treinar com bola em duas semanas, pode ter futuro de sucesso no futebol profissional.
- É um jogador especial, de muita qualidade. Tem parte física muito boa. Chegou aqui tendo que trabalhar a parte técnica, mas já teve uma evolução muito boa. É um garoto estudioso, religioso, que traz alegria para o grupo. Todo mundo gosta dele aqui. Está no caminho certo. Eu acredito muito nele - afirmou o “professor” do congolês.
Técnico Douglas Oliveira acredita no talento de
Merlin (Foto: Pedro Veríssimo / Globoesporte.com)
Sem graça, Merlin ouviu os elogios e abaixou a cabeça. Apenas na hora de falar com outro técnico, ele ganhou coragem novamente. Era a hora de pensar no futuro e fazer um pedido para o comandante do time que está em quinto lugar no Brasileirão:
- Oi, Joel. Queria que você me desse uma oportunidade. Eu sei que o time já está bem fechado, mas eu vou dar o meu melhor – garantiu o menino, com o brilho nos olhos de quem veio de longe com um sonho e vê no Glorioso a chance para cumprir a promessa feita à mãe na casa humilde no Congo.