Amigo, auxiliar, consultor e confidente do técnico, ex-goleiro do Fla disseca décadas de idas e vindas e se iguala num quesito: bom contador histórias
Às vésperas da decisão da Taça Rio, contra o Vasco, muitos torcedores
estão loucos para saber o que se passa pela cabeça do treinador do
Botafogo. Pois há apenas uma pessoa que tem todas essas informações. Há
45 anos indo e voltando na vida de Oswaldo de Oliveira, o auxiliar Luiz
Alberto é a verdadeira voz da razão das atitudes tomadas no comando
técnico do clube. A amizade de infância se estendeu para o futebol,
consolidou-se nos bastidores do exterior e teve seu laço mais estreito a
partir de 2001, quando a dupla, definitivamente, não se separou mais.
Ex-goleiro do Flamengo no início da década de 80, integrante do elenco
que foi campeão mundial em 1981, o confidente do chefe alvinegro é
discreto em escala máxima, a ponto de poucos notarem sua presença,
sempre mais observadora e com papos ao pé do ouvido com Oswaldo. Luiz
"San", apelido que recebeu no Kashima Antlers, do Japão, admite que tem
diversas semelhanças com o amigo, porém a maior delas foi facilmente
identificada em menos de cinco minutos com a reportagem do
GLOBOESPORTE.COM, após um treino no Engenhão: a veia para contar
histórias.
A
imagem perdeu a cor com o tempo, mas é possível ver Luiz Alberto
(segundo em pé) e Oswaldo (o primeiro agachado) sem camisa, de cabelos
loiros longos. Ele não jogou a partida amadora (Foto: Arquivo Pessoal)
Se deixar, confirma, ambos varam a noite batendo papo sobre futebol com
um chopinho gelado na mesa. A memória privilegiada de lado a lado só
falha num detalhe: quem é o mais velho?
- Eu tenho 60 anos, mas o Oswaldo (61) é gato, porque ele era mais novo
que eu na infância. Ficamos um tempo separados... Temos essa impressão,
é estranho (risos) - diverte-se.
Desde o colégio Daltro Santos, em Bangu, quando o atual treinador do
Botafogo era um meia-direita de categoria, a aproximação já existia.
Luiz Alberto recorda-se de grandes partidas disputadas contra turmas
rivais. Mas os caminhos distintos o separaram. Enquanto um firmou-se
como profissional na Gávea, o outro estudou e virou preparador físico,
espelhando-se no professor Carlos Alberto Parreira, que o orientou na
Zona Oeste carioca.
Em 1973, o primeiro reencontro: o Bangu, de Luiz, enfrentaria o
Bonsucesso, de Oswaldo. Um longo abraço e uma promessa: trabalhariam
juntos um dia. Na década de 80, ao encerrar precocemente a carreira
debaixo das traves, que nunca lhe assegurou um posto de real destaque, o
hoje auxiliar também correu atrás de sua graduação completa e foi parar
na seleção do Qatar, a convite de Evaristo de Macedo. Lá, bateu de
frente novamente com o antigo parceiro.
- Eu o ajudava no clube dele, o Al-Arabi, sempre que dava. E fazíamos
muita coisa juntos na cidade, até cozinhávamos. Abríamos um livro de
receitas, como os da Ana Maria Braga, e aprendíamos como fazer tudo, na
marra. Nunca tivemos um atrito - conta, orgulhoso, Luiz San.
Parceria definitiva
A terceira e derradeira oportunidade surgiu quando Oswaldo de Oliveira,
então campeão recente do Mundial de Clubes da Fifa, pelo Corinthians,
trouxe o amigo para o Fluminense, em 2001, ainda como preparador de
goleiros. Em 2005, ele se tornaram, enfim, técnico e auxiliar principal.
Além da ligação afetiva por tantas décadas, as características de Luiz
Alberto completam o ponderado comandante, que vez por outra não evita
seus momentos de perda de controle.
- Luiz é muito, muito calmo e me conhece bem. Nossa confiança e
entrosamento um com o outro são enormes. O equilíbrio e a inteligência
dele para o futebol fazem com que eu o consulte para tudo, desde
substituições, mudanças táticas a avaliações de desempenho. Por exemplo:
quando passei o Fellype Gabriel para a lateral esquerda pela primeira
vez, ele endossou na hora. Ganhamos o jogo no Japão - destacou Oswaldo,
que vive às voltas de improvisar seu versátil meia mais uma vez,
justamente na final do turno, que acontece neste domingo.
Luiz Alberto puxa na memória histórias dos encontros entre os dois (Foto: André Casado/Globoesporte.com)
- Já nasci com isso, sempre fui frio. É algo que se desenvolve ainda
mais quando goleiro. Nas piores situações, eu me mantenho calmo. A
frequência cardíaca baixa pode ajudar, enxergo o jogo de cima e passo
minha visão do adversário no intervalo, já que ele não gosta de ponto no
ouvido, e confrontamos as ideias - detalha Luiz "San", sem negar uma
semelhança da invencibilidade do Glorioso na temporada (21 partidas) com
a que emplacaram na chegada ao Japão.
- Lá foram 13 jogos, se não me engano, e tínhamos de tirar uma
diferença de doze pontos para o líder. O time estava bem atrás, em 2007.
Fomos campeões e ganhamos respeito. Estamos construindo aqui o caminho
para sermos campeões. As equipes começam de trás para frente. Ter um
poder defensivo sólido é fundamental, sem abrir mão do trabalho de
ataque. No Botafogo, existiu um entendimento rápido disso. O esquema é
parecido, marcamos sob pressão. E o Oswaldo trabalha o emocional do
jogador como poucos fazem - acredita.
Antes de uma partida pelo Kashima, Luiz Alberto e
Oswaldo posam para foto (Foto: Arquivo Pessoal)
Oswaldo posam para foto (Foto: Arquivo Pessoal)
Na onda atual dos assistentes que seguem carreira solo, Luiz Alberto
diz que não vai embarcar nessa. Sua lealdade não deixaria. E também
reconhece que não tem o perfil:
- Estou recente nesta função e quero ajudar meu amigo o tempo que eu
puder com ele. Sei que posso ser mais útil assim, e ele enxerga
qualidades em mim. Isso me basta.
Sem pestanejar, em contrapartida, o treinador parece não abrir mão de
sua presença diariamente, com a prancheta de atividades e as novas
ideias.
- É meu braço direito e esquerdo - resumiu.