Lembra Dele? Marinho Chagas vive de passado vitorioso e de mágoas
Em Natal, ex-jogador relembra 'bons tempos' no Bota, Flu e São Paulo, reclama de ter ficado fora das Copas de 78 e 82 e fala sobre a Seleção
Marinho está otimista com a Seleção Brasileira
(Foto: Augusto Gomes/GLOBOESPORTE.COM)
(Foto: Augusto Gomes/GLOBOESPORTE.COM)
"Roubei a bola do Pelé e dei um lençol nele. No lance seguinte, toquei
entre as pernas do Rei." É com um largo sorriso no rosto que o
ex-jogador Marinho Chagas, 60 anos, relembra sua estreia pelo Botafogo,
em 1972. "O Bruxa", como ficou conhecido nos anos 70, agora sonha ver o
Brasil hexacampeão mundial e Neymar eleito o melhor jogador de futebol
do planeta.
O melhor lateral-esquerdo da Copa do Mundo de 1974 abriu o coração para
falar sobre os momentos mais marcantes da sua carreira vitoriosa, assim
como os mais críticos de sua vida pessoal. Marinho revirou o baú da sua
memória, deu pitaco na seleção brasileira e aconselhou alguns talentos
em risco, como os atacantes Adriano e Jobson.
- Acho que a Seleção está no caminho certo. Os garotos ainda precisam
ganhar experiência, mas nós vamos ganhar a Copa do Mundo de 2014 e as
Olimpíadas de 2016. Não tenho dúvida - afirmou.
Para Marinho, Neymar será o próximo brasileiro a receber o prêmio de melhor do mundo da Fifa.
Marinho Chagas é o embaixador da Copa 2014
em Natal (Foto: Canindé Soares/Cedida)
em Natal (Foto: Canindé Soares/Cedida)
- O Neymar tem tudo para "acabar" com a Copa do Mundo de 2014. Acredito
que ele fará como Maradona fez em 1986. O garoto joga muita bola e vai
levar o prêmio de melhor do mundo, com certeza. Messi é Messi, e é o
melhor atualmente. Mas o moleque ainda é jovem e vai chegar lá também.
De chuteiras penduradas há mais de duas décadas, Marinho Chagas ocupa
cargo comissionado na Prefeitura de Natal. No ano passado, foi nomeado
pela então prefeita da cidade, Micarla de Sousa, embaixador da Copa do
Mundo 2014 na capital potiguar. A pouco mais de um ano e meio do início
do Mundial, ele esbanja entusiasmo.
- Durante a Copa do Mundo só vai dar Brasil e Marinho Chagas. A Seleção dentro de campo, e eu fora dele, aqui em Natal.
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Depois de encantar potiguares e pernambucanos com as camisas de ABC e
Náutico, Marinho chegou ao Rio de Janeiro em 1972, já com o apelido de
"Canhão do Nordeste". O empate por 1 a 1 com o Santos de Pelé fez o
norte-rio-grandense franzino e loirinho, à época com apenas 20 anos,
cair nas graças da torcida alvinegra logo na estreia. Em pouco tempo ele
já era o melhor lateral-esquerdo do futebol brasileiro e vencedor de
duas edições do prêmio Bola de Prata da revista "Placar". Recentemente, foi indicado ao "Time do Século" do Botafogo e foi homenageado no site oficial do clube (assista ao vídeo acima).
- Já no primeiro jogo pelo Botafogo eu fiz um gol de falta e fui pra
galera. O Pelé não gostou do lençol e da caneta que eu dei nele. Disse
que eu deveria respeitar o Rei do Futebol. Mandei até ele tomar naquele
canto (risos). Mas, no fim do jogo, dei um abraço nele e pedi desculpas.
O súdito abusado de antes virou parceiro de Pelé no fim da década de
70, no New York Cosmos, nos Estados Unidos. Ao lado deles, alguns dos
maiores jogadores da história formaram o time dos sonhos de muitos
apaixonados por futebol. Franz Beckenbauer, Johan Cruyff e Carlos
Alberto Torres eram algumas das estrelas do timaço que popularizou o
"soccer" na terra do basquete e do futebol americano.
Irreverente e galã
A famosa e polêmica "paradinha" foi banida do futebol recentemente.
Craques como Pelé, Rogério Ceni e Neymar costumavam realizá-la antes das
cobranças de pênalti, para desespero dos goleiros adversários. O que
nem todo mundo sabe é que Marinho Chagas, com seu jeito irreverente,
inovou neste recurso, ainda nos anos 70. E ele não esconde a felicidade
ao relatar como se deu o lance, que acabou inspirando jogada executada
nos últimos anos pelo chileno Valdivia.
- Aconteceu quando eu estava no Fluminense e o clube fez uma excursão
pela Europa para jogar um torneio de verão na Espanha. Quando fui cobrar
um pênalti, dei um 360 graus, joguei a perna para o lado e chutei o
vento. O goleiro caiu e eu só encostei para a rede (risos). Os espanhóis
ficaram boquiabertos, sem saber como eu tinha feito aquilo - lembrou.
Aos 60 anos, Marinho está empolgado para a Copa 2014 (Foto: Augusto Gomes/GLOBOESPORTE.COM)
Nesta mesma viagem pelo velho continente, Marinho Chagas realizou uma
de suas maiores conquistas amorosas. Ele se vangloria da história e
"enche a boca" para dizer que "pegou" uma princesa de Mônaco.
- Eu era bonito e sarado. Loirão de olhos verdes, a princesinha ficou
doida quando me viu numa festa com o pessoal do time. Dancei com ela a
noite toda e beijei a princesa várias vezes. Bom demais.
Marinho Chagas sempre foi muito vaidoso. Na época dele não existia o
termo metrossexual, mas digamos que ele era uma espécie de David Beckham
dos anos 70 e 80. Roupas espalhafatosas, cordões de ouro e carrões de
marca eram constantes em sua carreira. E isso lhe rendeu mais uma boa
história. Dessa vez com um Mercedes-Benz conversível.
- Estava caminhando na Europa e passei na frente de uma loja. Quando vi
aquele carro, não consegui me controlar. Aluguei o "bicho" e fui direto
para o hotel onde estávamos hospedados. Chegando lá, todo mundo me
chamou de maluco, inclusive o Paulo Cezar Caju. Foi muito engraçado,
porque o presidente do Fluminense (Francisco Horta) pegou carona comigo e
deu risada da história - diverte-se.
Mágoa
Marinho Chagas marcou época no Botafogo e na
seleção brasileira (Foto: Divulgação/Botafogo)
seleção brasileira (Foto: Divulgação/Botafogo)
Na Copa de 1974, na Alemanha, Marinho Chagas foi eleito o melhor
lateral-esquerdo do mundo, mesmo após a eliminação da seleção brasileira
na fase semifinal do torneio, após derrota para a Holanda. Mas um
assunto que magoa o "Bruxa" é a não convocação para as Copas de 1978 e
1982. E o ex-jogador não esconde a tristeza por ficar de fora dos
Mundiais. Ele tem consciência de que ainda estava no auge da carreira
naquela época e sente que poderia ajudar o Brasil a conquistar o tetra.
- Modéstia à parte, eu era o melhor lateral do Brasil em 78. Mas o
técnico Cláudio Coutinho preferiu levar Edinho e Rodrigues Neto para
jogar na esquerda. Também deixou o Falcão e o Paulo Cezar Caju fora. Deu
no que deu. Em 82, discordei da decisão do Telê. Júnior estava muito
bem, mas a minha fase no São Paulo ainda era melhor - comentou o
ex-jogador, que no Tricolor Paulista ganhou, inclusive, seu único título
num grande clube: foi campeão estadual em 1981.
Marinho Chagas sofre de hepatite C, bronquite, ácido úrico e
hipertensão. Mas a sua maior doença parece ter sido curada de vez. O
craque, que esteve próximo de perder o jogo contra o alcoolismo, fez um
transplante de fígado e hoje vive relativamente bem de saúde. Ele
aproveita a oportunidade e manda uma mensagem aos atletas que vivem ou
viveram problemas extracampo, como os atacantes Adriano e Jobson.
- Cada pessoa é responsável por escolher o que vai fazer da sua vida.
Amigos não obrigam ninguém a fazer nada. Eu, por exemplo, tive problema
com o álcool, mas só depois de encerrar a carreira. E foi porque eu
quis. Quando eu jogava, me dedicava somente ao trabalho e nunca bebi. O
que eu aconselho a garotos e jogadores profissionais é que tenham
humildade e pensem nos pais deles, pois o amanhã pode ser muito triste -
finalizou.