Decisivo, Seedorf supera melhor marca pessoal em um campeonato
Com a camisa do Botafogo, holandês consegue bater recorde de gols em uma competição e caminha para fazer a temporada mais artilheira da carreira
Contra o Dragão, Seedorf anotou o gol de número
800 do Brasileirão 2012 (Foto:Marcelo Santos/AGIF)
800 do Brasileirão 2012 (Foto:Marcelo Santos/AGIF)
Autor de um dos gols da vitória do Botafogo sobre o Atlético-GO por 4 a
0, neste último sábado, no Engenhão, o meia Seedorf voltou a ser
decisivo. Se a expectativa pelo bom futebol do craque era natural entre
os torcedores alvinegros quando desembarcou no Brasil, o momento de
artilheiro vivido pelo meia holandês surpreende. Quase três meses após
sua estreia contra o Grêmio, o camisa 10 já anotou 8 gols em 20 jogos no
Brasileirão - média de 0,4 por confronto -, alcançando uma marca
inédita em seus 20 anos de carreira. Desde que debutou pelo Ajax em
1992, o jogador nunca havia marcado mais de sete vezes num campeonato.
Ídolo, conselheiro, exemplo para os mais jovens, Seedorf é, além de
tudo isso, um artilheiro. Pelo menos, é o que o jogador tem mostrado com
a camisa do Botafogo no Campeonato Brasileiro. Consagrado na Europa
como armador de jogadas ou segundo volante, o camisa 10, de fato, nunca
havia se destacado como um grande goleador. No entanto, sua boa fase tem
enchido os botafoguenses de otimismo. Aos 36 anos, o jogador vive um
momento ímpar em sua trajetória, sendo um dos principais responsáveis
pela boa campanha do Glorioso, sexto colocado na competição nacional,
com 50 pontos.
- Não estou aqui com a minha cabeça em objetivos pessoais. Sei quantos
gols eu fiz, mas ligo mesmo para o resultado final do time. Não adianta
fazer muitos gols e não ganhar, prefiro não fazer e ganhar. Faço mais
gols, por causa da posição e pela forma como joga o Botafogo, que gosta
de atacar, de jogar com a bola no chão, de entrar na área com
velocidade. Em 2007, ganhei o prêmio de melhor jogador da Uefa sem
pensar nisso, mas jogo a jogo. A consequência foi um bonito prêmio
pessoal - disse Seedorf.
Com dois gols de Seedorf, Botafogo vence o Cruzeiro por 3 a 1 (Foto: Paulo Fonseca / Agência Estado)
O bom desempenho de Seedorf com o Botafogo no Brasileirão fica ainda
mais evidente quando comparado com os números dele nos principais
torneios europeus. No Campeonato Italiano, onde atuou por 13 temporadas,
o atleta viveu sua melhor fase artilheira nas temporadas 2006/2007 e
2007/2008, quando, em ambos os casos, anotou sete gols em 32 partidas
pelo Milan, atingindo média de 0,22. Nesse mesmo período, o camisa 10
conquistou a Liga dos Campeões, a Supercopa da Europa e o Mundial de
Clubes da Fifa.
- O futebol brasileiro é menos tático e muito técnico. Vi os números e
os jogadores correm 11km por jogo. Não é a quantidade do trabalho. No
Brasil trabalham muito a bola. É difícil ver um jogador dominar mal, até
a marcação por pressão é diferente por isso. Na Europa, acontece mais,
tem menos criatividade, mais teoria e menos intuição. Trabalha-se mais
taticamente. Na verdade, é uma maneira de interpretar a vida, não só o
futebol. Já havia uma diferença grande da Itália para a Espanha com
relação a isso. É só ver como jogam na Eurocopa. Acho interessante ter
vivido diretamente essas maneiras de jogar.
Contratado como a principal aposta do Glorioso para a temporada,
Seedorf ainda está em fase de adaptação ao futebol brasileiro e seu
calendário. Mesmo assim, o faro de gol do jogador nunca esteve tão
apurado. Restando cinco jogos para o término do campeonato nacional, o
craque holandês também está cada vez mais próximo de bater seu próprio
recorde numa temporada – em 2006/2007 e 2007/2008 anotou 10 gols em cada
uma. No entanto, uma lesão muscular na coxa direita no jogo do último
sábado diante do Dragão pode adiar mais este feito do jogador, que deve
se submeter a exames nesta segunda-feira para saber a gravidade da
lesão.
- No ano em que joguei mais na frente com o Milan, fiz 10 gols. Sempre
participei muito das jogadas ofensivas, com Kaká e Inzaghi no time, mas
entrava na área com menos frequência do que estou fazendo agora. Estou
gostando da posição, cresci nela. Mas a coisa mais importante é que
funciona para o time, que está se conhecendo melhor, com mais
naturalidade. Um relacionamento muito bom permite a todo mundo render
mais - concluiu o jogador.
Seedorf, o "operário"
Seedorf tem uma característica única na história recente do Milan: ele
desempenhou todas as funções no meio-campo. Em 2008, também chegou a
jogar como segundo atacante e até mesmo como ala no esquema 4-3-2-1.
O jogador despontou no futebol como volante no Ajax, Sampdoria, Real
Madrid e Inter de Milão, mas foi no Milan que começou a atuar como
armador. Na temporada 2006/2007, com a saída de Rui Costa para o
Benfica, o técnico Carlo Ancelotti passou a explorar a versatilidade e o
passe refinado do craque holandês, que ficou responsável pela criação
junto com o brasileiro Kaká.
No entanto, Seedorf também tinha um importante papel defensivo: voltava
para compor a linha do meio de campo formada por Ambrosini e Gattuso, e
com Pirlo mais atrás, congestionando o setor para dificultar a troca de
passes e as investidas dos adversários. Com esta formação, o Milan
conquistou a Liga dos Campeões naquela temporada. Mesmo atuando um pouco
mais recuado que o brasileiro, Seedorf marcou sete gols no Calcio, um a
menos do que Kaká.
Na temporada seguinte, as entradas de Bonera e Kaladze nas laterais não
promoveram grandes mudanças nas funções desempenhadas por Seedorf no
time campeão do Mundial de Clubes. Tanto que o jogador repetiu a dose:
anotou sete gols no Campeonato Italiano. Mas em 2009/2010, com a
transferência de Kaká para o Real Madrid, o jogador ganhou mais
liberdade e passou a atuar como um legítimo camisa 10. No entanto, a
mudança tática promovida por Carlo Ancelotti não deu certo. Seedorf já
não tinha mais tanta velocidade. Por isso, na temporada 2011/2012, a
última do jogador no clube italiano, voltou a jogar como volante com a
ida de Pirlo para o Juventus.
- O Seedorf sempre teve um sonho que o acompanhou ao longo de sua
carreira: atuar como um verdadeiro camisa 10. Esse foi um dos motivos
que o fez trocar o Inter de Milão pelo Milan. Na temporada 2001/2002,
ele estava muito irritado com o técnico Hector Cuper, do Internazionale,
que chegou a colocá-lo para desempenhar todas as funções no meio-campo.
Quando foi para o Milan, o clube contava com o meia português, Rui
Costa, e em seguida houve a explosão de Kaká. Desta forma, ele nunca
teve tanto espaço para atuar como um camisa 10, situação que motivou
alguns pequenos atritos entre o jogador e o técnico Carlo Ancelotti, que
atualmente comanda o PSG. Quando, finalmente, teve a oportunidade, não
correspondeu - disse Massimo Basile, editor do Corriere Dello Sport
(ITA).
Uma das explicações para o sucesso de Seedorf no futebol brasileiro é o
posicionamento do jogador. No Botafogo, ele joga na penúltima linha
ofensiva, ao lado de Andrezinho e Fellype Gabriel (ou Lodeiro). No
esquema do técnico Oswaldo de Oliveira, o trio de armadores tem a
obrigação de se apresentar na área para completar as jogadas em boas
condições de marcar, favorecendo a intensa movimentação na frente.
- O Seedorf é diferenciado. Embora comece sempre jogando pelo lado
esquerdo, é um jogador que acha o seu espaço dentro partida. Ele é um
dos melhores volantes do futebol, embora atue como meia no Botafogo.
Esse posicionamento foi o grande achado do Oswaldo de Oliveira, que está
sabendo utilizar a boa velocidade, a qualidade do passe e o poder de
decisão do Seedorf em pról da equipe. Aos 36 anos, ele é um cara que se
cuida bastante fisicamente e que está sempre se reinventando. Um jogador
moderno – com visão de jogo e inteligência, acima de tudo, - e muito
melhor do que a maioria dos jogadores que temos no Brasil. Se ele fosse
brasileiro, certamente seria convocado para a Seleção - fez coro Lédio
Carmona, comentarista do SporTV.
* Estagiário Igor Castello Branco sob a supervisão de Rodrigo Breves