Botafoguense abre portas de relicário com meio século de fanatismo
Filho de rubro-negro, Hércules Nogueira, de Resende, no Sul do RJ, mostra sua coleção de objetos que tem um único tema: o Glorioso
Objetos
de todos os tipos, de várias épocas diferentes... Seu Hércules não
perde nada (Foto: Ana Cláudia Gonçalves/GLOBOESPORTE.COM)
O ano é 2013, mas a incrível campanha do Botafogo leva as lembranças de
Hércules Nogueira Filho, de 59 anos, a décadas passadas. Tempos de Mané
Garrincha, ídolo do aposentado de Resende, no Sul do RJ.
O time da estrela solitária tem em sua história anos difíceis também,
de rebaixamento, eliminações, tristezas que Hércules sabe bem contar.
- Principalmente em 2003, quando o Botafogo foi rebaixado, os
flamenguistas me zoavam, mas eu comprei uma camisa e andava estampada
nela uma frase mostrando meu apoio e amor ao time, mesmo em uma situação
como aquela - disse.
E ninguém melhor que ele para descrever toda jornada do clube. Hércules
não lembra de jogos que não tenha acompanhado. Inclusive, ele anota
todos os resultados em um caderno. Quando mais novo ia ao estádio, hoje
acompanha de casa. Mas está tudo registrado. Curioso, não? Espere só
para conhecer um pouco mais a vida do aposentado.
Seu Hércules guardou um espaço especial em
casa (Foto: Ana Cláudia Gonçalves)
casa (Foto: Ana Cláudia Gonçalves)
Filho, irmão, sobrinho e neto de flamenguistas, que aos seis anos já
era doente pelo Glorioso, sem qualquer influência. A história de
Hércules com o time do coração, segundo ele, começou já na maternidade,
mas não sabe explicar a admiração, principalmente, por nunca ter tido
ninguém por perto que torcesse pelo clube. Esse amor foi se tornando tão
intenso que Hércules começou a colecionar tudo que ganhava ou comprava
do time. Hoje, mais de 50 anos depois, o salão do segundo andar da casa
onde mora virou um cantinho curioso, cheio de histórias para contar. E
tem de tudo, tudo mesmo. Desde livros, recortes de jornal a caixa de
fósforos personalizada.
- O primeiro presente que ganhei do meu pai foi uma espirradeira,
espécie de garrafa usada para lançar espuma no carnaval. E ela está
aqui, guardadinha com as demais latinhas e garrafas que coleciono -
contou.
Entre tantos objetos que contam a história de Hércules com o Botafogo,
alguns emocionam o morador de Resende. A primeira bandeira que ganhou do
pai, em 1968, quando o clube foi bicampeão carioca, é um deles.
- Essa aqui é meu xodó, meu pai quem me deu, está velhinha, inclusive,
estou procurando alguém para dar um jeito de conservá-la porque está
começando a desfazer o pano – afirmou.
Seu
Hércules mostra a primeira bandeira do Botafogo, que ganhou do pai, em
1968, quando o time foi bicampeão carioca (Foto: Ana Cláudia
Gonçalves/GLOBOESPORTE.COM)
Mexendo um pouco mais na sala, que é mais uma espécie de santuário do
time carioca, encontramos o radinho de pilha, que não funciona mais, e
era usado por ele para ouvir os jogos na adolescência, principalmente em
dias de clássico em campo e guerra dentro de casa: Fla x Bota.
- Eu saía para rua, não ficava em casa de jeito nenhum. E naquela época
a frequência de rádio não era muito boa, eu colocava perto do poste e
sofria para entender - lembra, saudoso.
Recortes de jornal também fazem parte da coleção
(Foto: Ana Cláudia Gonçalves)
(Foto: Ana Cláudia Gonçalves)
Na caixinha de sapato, enfeitada por ele, recortes de jornais antigos,
só com o nome ou escudo do time, em grande quantidade e muitas vezes
repetidas. E sabe o porquê disso?
- Eu não consigo ler um jornal, revista, qualquer coisa, que tenha o
nome, escudo, e jogar fora. Eu recorto e guardo tudo - contou, aos
risos.
São mais de 50 camisas, centenas de pôsteres, livros, canecas, velas,
imãs, miniaturas, chaveiros, tênis, bandeiras, fotografias com os
ídolos, guarda-chuva, embalagem de ovo de chocolate. E, entre tantos
objetos surpreendentes, uma relíquia chama a atenção: o livro que conta a
história de Garrincha por Telmo Zanini, e que foi proibido pela Justiça
de circular na época, a pedido da família, está guardado com muito
carinho nas prateleiras.
Livro de Garrincha foi retirado de circulação
(Foto: Ana Cláudia Gonçalves)
(Foto: Ana Cláudia Gonçalves)
- Ganhei de uma amiga que trabalhava comigo em 1984. Eu não tinha
conseguido comprar, e ela apareceu com um exemplar pra mim, esse eu
guardo com muito carinho, apesar de a família ter dito na época que o
conteúdo não condizia com a história de vida dele - completou.
No meio do santuário do Glorioso, onde já perdeu as contas da
quantidade de tudo que tem guardado, Hércules mostra a satisfação com o
grupo que este ano venceu os dois turnos do Carioca e só tem duas
derrotas anotadas no calendário deste ano. Sobre o jogador que poderia
ser comparado ao ídolo do futebol, ele ressalta:
- Comparar ao Garrincha, impossível, mas falar de um jogador que pode,
talvez lembrá-lo, Seerdof. Ele é genial, tem um carisma, um futebol.
Ele veio para trazer alegria ao futebol carioca de uma maneira geral.
Seu Hércules influenciou o filho a ser botafoguense
(Foto: Ana Cláudia Gonçalves)
(Foto: Ana Cláudia Gonçalves)
Apesar de a família ser rubro-negra, todas as gerações que vieram após
ele são botafoguenses. O único filho foi completamente influenciado pela
paixão paterna e segue os passos de Hércules. Guilherme tem 30 anos,
ajuda o pai a manter o espaço e a aumentar a coleção.
- Eu falo para ele, o que eu quero é que passe tudo que está aqui para
frente. Vai ficar pra ele, para os filhos, quem vier depois de mim -
disse.
Sobre a possibilidade de desfazer de tudo que tem naquele quartinho, Hércules tem uma resposta pronta.
- Não vendo de jeito nenhum. Nem pelo maior prêmio, nem por R$ 90
milhões. Isso aqui é minha vida, o Botafogo é a minha vida – contou
emocionado.