Uma frase de Joel Santana, heptacampeão Estadual, durante a festa alvinegra no gramado resume bem como a simplicidade ainda funciona nos momentos difíceis e decisivos.
“Minha prancheta sumiu!”
Sei que é repetitivo voltar a falar da prancheta de Joel. Mas o fato é que a partir dela é que o campeão de 2010 no Rio começou a ser formado. Ele assumiu o Botafogo em frangalhos, após levar uma sova de 6 a 0 do Vasco na terceira rodada da Taça Guanabara, e levou o mesmo time ao título Estadual, ganhando os dois turnos, sem direito a prorrogação, pênaltis e muito menos finalíssima. Campeão por antecipação no Rio, algo que não acontecia desde 1998, quando o Vasco dispensou as finais e levou o título direto.
E o que mudou desse Botafogo-2010 para aquele que, nos três últimos anos, perdeu três finais dificílimas para o Flamengo? E o que está diferente no grupo rubro-negro esse ano? Antes de começar as explicações, é bom lembrar que Flamengo e Botafogo se enfrentaram três vezes nesse Estadual. O Botafogo ganhou duas (eliminou o rival na Taça Guanabara e conquistou o título hoje) e empatou um, com um gol de Adriano nos acréscimos. Mas, de volta à pergunta do início do parágrafo, qual foi o motivo da transformação?
Joel Santana é o começo da mudança. Sua estrela é inegável. Quem o tem como treinador, já recebe o bônus da sua prancheta encatada, da sua competência e do seu alto astral. Sua simplicidade pode não ser campeã sempre, mas ajuda no ambiente de um grupo, na união, na crença do jogador sobre o que pensa o treinador. O Botafogo começou a ser campeão quando tirou Joel Santana do seu curto desemprego.
Diferentemente de 2007, 2008 e 2009, desta vez o Botafogo tinha um goleiro bom, seguro e que tinha a confiança dos torcedores. Jefferson tem carisma, tem vontade de ganhar, e consegue ser frio e quente ao mesmo tempo. Não treme e não sofre com decisão. E, nos momentos em que o time mais precisou dele, ele atendeu ao chamado. Quando pegou o pênalti mal cobrado por Adriano e quando fechou o paredão na hora decisiva do clássico, em plena pressão rubro-negra.
O Botafogo-2010 também não tem um bom time. Não está pronto. Precisa de reforços urgentes para o Brasileirão. Mas agora lhe sobra algo que faltava na perda dos três títulos anteriores. Tem coração. Tem garra. Tem paixão. Tem uma espécie de alma argentina, com o intempestivo Herrera, e da loucura, às vezes delirante, às vezes fria como a de um iceberg, do uruguaio Loco Abreu, capaz de fazer o gol do título, com uma cobrança de pênalti “A la Panenka, Zidane, Djalminha… “. Cobrança de quem tem confiança, peso, estofo, verniz e não tem medo. Muito menos de cara feia.
O Botafogo teve isso tudo. E ainda pegou um adversário que até lutou, mas está confuso, pressionado, mal preparado e dividido com o peso da reta final da primeira fase da Libertadores. O Flamengo está intranquilo. Se hoje tem Vagner Love, artilheiro do Estadual, lutador e incansável – foi ele que empatou, no final do primeiro tempo -, tem Adriano pesado e com a cabeça longe. Tem Bruno irritadiço demais. Tem três volantes juntos e mal escalados por Andrade, inseguro e querendo provar algo que o título brasileiro que lhe garantiu. E tem um meia que não pode ser titular do Flamengo: Michael. Tudo isso, mais erros normais a uma decisão, atrapalharam a equipe e frearam o sonho do tetra.
Enfim, era mesmo o Estadual do Botafogo. Um time que saiu de uma série de derrotas e reencontrou o caminho da vitória por um simples (e decisivo) detalhe: juntou num mesmo grupo quem tem estrela, sangue e, principalmente, não tem medo de ser feliz (e de ser campeão).
Parabéns ao Botafogo.
E que o próximo Estadual, em 2011, seja tão bom quanto foi a final de hoje. Não custa sonhar acordado.